Carros do passado eram membros de família e tinham até nome; o que mudou?

Antigamente cada veículo da família recebia um apelido, assim como os animais de estimação Em Bonequinha de Luxo, comédia romântica de 1961 dirigida por Blake Edwards, baseada no romance de Truman Capote, a personagem Holly Golightly (Audrey Hepburn) tinha um gato sem nome. Se ele fosse batizado, achava ela, um vínculo seria criado. E a independente Holly não queria formar laços afetivos. Saiba-mais taboola Sempre dei nome aos gatos que tive. E também aos carros e às motos. Cresci em um tempo em que o carro era considerado membro da família e, desse modo, cada criatura de lata recebia nome ou apelido. Em casa, não se dirigia o Citroën TA, mas sim a Brigite, referência à sensual atriz francesa Brigitte Bardot. Um amigo da família vinha nos visitar com a temperamental Sofia, a Alfa Giulietta da década de 1960 que homenageava Sophia Loren; um dos meus irmãos não desfilava com sua Lambretta LD, mas com Lola, talvez o nome de uma paixão que ele teve na adolescência. Rocinante, o cavalo de Dom Quixote de La Mancha, era como uma ex-namorada chamava seu Fuscão 1982; Olívia foi como passei a chamar o 1300 1968 Verde Caribe; e, para uma perua alemã, o nome não poderia ser outro: Brünnhild, a destemida valquíria da mitologia nórdico-germânica e personagem da ópera O Anel dos Nibelungos, de Wagner. Atualmente convivo com Frida, um Mercedes 190E de 30 anos de idade, e sinto falta de Margareth, a majestosa moto de origem britânica que fui obrigado a vender. Também tenho saudades de Nagako, nome que tomei emprestado da imperatriz japonesa para uma nada comportada Honda 750. Ao criar vínculos, as despedidas se tornam mais difíceis... até com as máquinas Foto: Honda XLV750R 1983/Divulgação Cultivar vínculos tem seu preço: as despedidas são sempre penosas, como bem sabia a personagem de Truman Capote. Tenho impressão (e é só impressão) de que, nesses tempos de transporte por aplicativo, a relação entre homem e máquina é mais fria que em épocas idas. E de que, para muita gente, batizar meio de transporte não passa de sandice. Quando pergunto pelo nome do carro que alguém acabou de comprar, a resposta sempre vem recheada de siglas e numerais: este é o XRY 2200. Sim, é o que está colado na carroceria, mas e o nome afetivo? Impressão minha, igualmente, de que até a imaginação popular anda escassa: não tenho notícias de novos apelidos que acabam grudando, para bem ou para mal. Havia o depreciativo Cornowagen, versão do Fusca com teto solar que teve curta vida por causa do machismo exacerbado, e o simpático Fusca Fafá, com suas fartas lanternas traseiras. Renault Dauphine ficou conhecido no Brasil como o carro "que desmancha sem bater" Divulgação Os Renault Dauphine/Gordini eram Leite Glória, “que desmancha sem bater”. A zombaria levou a fábrica a submeter um carro original a uma dura prova de resistência: rodar 50 mil km só com paradas para reabastecimento. A maratona terminou após 22 dias com o Gordini amassado e sem para-brisa, consequência de um capotamento, e com um novo apelido: Teimoso. Botinha ortopédica (Uno de primeira geração), Tristonho (Fiesta 1996), NhecoSport (EcoSport de 2003)... a lista é grande. Talvez apenas os motociclistas ainda mantenham o hábito — ou a sandice — de dar nome pessoal às suas montarias, uma vez que a relação entre piloto e máquina é mais íntima: quem nunca conversou com sua moto durante uma viagem? O ex-piloto nove vezes campeão de motociclismo Valentino Rossi mantinha longos papos com as motos antes da largada. No grid da MotoGP é comum ver pilotos fazendo carinho no tanque de suas máquinas. Mas o que certamente falam para suas velozes companheiras nesse momento fica entre os dois. Quer ter acesso a conteúdos exclusivos da Autoesporte? É só clicar aqui para acessar a revista digital. Mais Lidas Luiz Guerrero é jornalista, apaixonado por carros antigos (originais) e motos de qualquer época

Carros do passado eram membros de família e tinham até nome; o que mudou?
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Antigamente cada veículo da família recebia um apelido, assim como os animais de estimação Em Bonequinha de Luxo, comédia romântica de 1961 dirigida por Blake Edwards, baseada no romance de Truman Capote, a personagem Holly Golightly (Audrey Hepburn >>>

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